Daniel Cintrão Pires de Andrade
Entre meados de 2019 e o final de 2020 o autor levou a cabo uma recolha bibliográfica de todas as marcas de oleiro em terra sigillata no território da província romana da Lusitania. O objetivo deste estudo, para além da simples inventariação, era o de analisar comercialmente e economicamente a província durante o período alto imperial, utilizando as marcas de oleiro em terra sigillata como indicador económico. Neste texto documenta-se uma parte do resultado da análise de 3778 marcas de oleiro, integralmente reproduzido na tese de mestrado do autor, entregue em 2021.
O primeiro grupo de terra sigillata a ser importado para a Lusitania é a de origem itálica, desde o início da produção da mesma (c. 40 a. C.). A terra sigillata itálica é também a produção menos representativa, com aproximadamente 20% dos fragmentos, dos quais apenas aproximadamente 7% provém das olarias de Arezzo. O pico de consumo deste grupo de terra sigillata dá-se no virar da Era, com um subsequente decair, devido maioritariamente à competição exercida a partir dessa data pelas grandes olarias sudgálicas. No final do principado de Tibério, a terra sigillata sudgálica toma primazia no quadro das importações. A maioria dos vasos sudgálicos provêm da grande olaria de La Graufesenque, cujos produtos representam 33.8% de todos os fragmentos com marcas de oleiro. Os seus produtos atingiriam o seu floruit comercial na Lusitania com o avento da dinastia flávia. A sua subsequente queda, mais abrupta que a da terra sigillata itálica, acompanha provavelmente a quebra nas exportações de La Graufesenque, cujo encerramento se pode dever a uma conjunção de fatores, como falta de recursos materiais, meios de transporte e competição nos seus mercados preferenciais.
O início da importação de terra sigillata hispânica dá-se por volta do principado de Cláudio, como demonstram os contextos de Ammaia, Mirobriga, Baelo Claudia e Conimbriga. No entanto, devido a uma falta de contextos pré-flávios preservados e estudados, a sua influência só se faz sentir por volta de 80 d. C., altura em que as suas importações disparam para níveis elevadíssimos. De facto, a terra sigillata hispânica é a mais bem representada na província, compondo aproximadamente 45.8% de todos os fragmentos.
Os conventus que compõem a Lusitania apresentam níveis comerciais diferentes e picos comerciais em alturas diferentes. O conventus pacenses é aquele que tem o menor nível de terra sigillata, mas o que chega ao seu auge mais cedo, devido ao grande peso comercial de Salacia e Pax Iulia (compreendido através arqueossítio de Represas). A partir do virar da Era, o comércio no conventus pacenses estabiliza, caindo a partir de 90 d. C. O conventus scallabitanus apresenta um apogeu comercial por volta de 50 d. C., maioritariamente devido aos grandes volumes de terra sigillata sudgálicas nos dois maiores centros de consumo, Olisipo e Conimbriga. Destes, apenas Conimbriga continua com um aumento no consumo com o advento da terra sigillata hispânica e a queda da terra sigillata sudgálica. O conventus emeritensis é o que mais tardiamente alcançou o seu fluroit, durante o período flávio. Os grandes centros de consumo deste conventus têm o seu pico entre 80 e 100 d. C., como Augusta Emerita, Ammaia ou Capera. Augusta Emerita, até 70 d. C., mantem-se ao nível comercial de Olisipo, Conimbriga e Pax Iulia (em termos absolutos), mas com o advento da terra sigillata hispânica, o seu comércio explode para o dobro dos níveis anteriores.